Proposta do Blog


"Tudo é impossível até que seja tentado!"
Esta frase é a que tem orientado a minha vida há
muitos anos e que acredito resumir muito
bem o espírito Asperger. A partir de agora, o (a) leitor(a) vai fazer comigo
uma intensa viagem ao mundo da Mente Asperger e seu funcionamento interno e
visão de mundo, minha vida ,minhas teorias sobre esta Síndrome(que em muita
coisa acredito aplicar-se também ao Autismo Clássico) e meu convívio com outros
Aspies.Como se sabe nos meios
científicos, a Síndrome de Asperger faz parte do Autismo, mas é considerada por
eles uma variação mais leve,parecida com o que chamam de Autismo de Alto
Desempenho.O porquê do título deste blog o (a) leitor(a) saberá ao longo dos tópicos e postagens que aqui serão inseridos com o tempo.
Desde já aviso, no entanto, que , embora não se
possa afirmar com exatidão e responsabilidade de que estas minhas idéias e teorias se apliquem a todos os Aspergers e
demais autistas,são aplicáveis sim a um grande número de casos.
Explico: A Síndrome de Asperger tem características
e manifestações com grande variedade de graus e diferenças muito pessoais entre
si, cada caso é um caso específico, e poucas são realmente universais.Uma
expressão que usarei muito aqui e que pode gerar dúvidas é “Neurotípico”,o
significado dela é o de pessoas que não são portadoras de Síndrome de Asperger,
nem são Autistas.Aqui também irei postar , além
de textos com minhas teorias e idéias sobre a Síndrome, também
apresentarei e comentarei notícias , vídeos e reportagens de televisão
sobre Asperger que coletarei da net,com críticas quando
necessárias.Igualmente o projeto abrange orientações a mães de Asperger
e sugestões a Terapeutas.Penso também na possibilidade de, de vez em
quando entrevistar um(a) terapeuta e/ou profissional de inclusão e
também outros aspies.
Isto dito, desejo aos leitores e às leitoras uma boa
leitura!

Cristiano Camargo
48 anos
Divorciado
Portador de Síndrome de Asperger, que superou as "limitações" de sua síndrome, tanto sociais como neurológicas, sozinho, sem remédios nem tratamentos,por opção consciente.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Reflexão sobre a Sociabilidade: Uma Análise:


O estereótipo clássico da pessoa sociável é o daquela com dezenas, centenas de amigos, que está sempre nos barzinhos, boates, danceterias, loundges,frequentemente viajando, fazendo esportes radicais, reunindo os amigos em festas, sítios, indo a excursões, jamais sai de casa desacompanhada de muita gente, tem sua casa frequentemente visitada pelos amigos e está frequentemente visitando-os também, e quase que invariavelmente, bebe bebidas alcoólicas e fuma.
A maioria das pessoas costuma achar que Sociabilidade é isto, ter este tipo de estilo de vida, de comportamento, de atitude. E muitos pais se iludem, querendo ou sonhando que os filhos se encaixem neste padrão tão comum ,neste tipo de sociabilidade, que muitas vezes, as pessoas, bitoladas pelo chamado senso comum,é só este o tipo de sociabilidade que conseguem conceber e enxergar, e ficam cegos a outros tipos e tendem a não aceitá-los.
Mas este tipo de sociabilidade, a Clássica, tem muitos defeitos e pode esconder muitos problemas inclusive psicológicos e psiquiátricos: muitas pessoas muito sociáveis na verdade, em seu íntimo se sentem muito isoladas e solitárias, com um vazio existencial interno, que tentam preencher rodeando-se do máximo de amigos possível, e procurando resolver os problemas dos outros ao invés de cuidar dos seus. São pessoas que esconder e disfarçam uma baixíssima auto estima e forte depressão, e não conseguem aceitar-se a si mesmas como são ou enfrentar-se a si mesmas, e usam os amigos para tentar escapar da realidade, especialmente, sua realidade interna, da sua psiquê.São pessoas que acabam ficando viciadas em vida social e não conseguem mais viver fora dela ou sem ela, e perdem suas identidades, opiniões próprias, dependendo dos amigos para tomar decisões ou formar opiniões.São em suam, pessoas altamente infelizes, usando uma máscara de feliz.Os amigos geralmente não percebem a verdadeira pessoa por trás da máscara, por que os(as) viciados(as) em sociabilidade são em geral excelentes “atores/atrizes” e escondem seus problemas muito bem e se dizem psicologicamente saudáveis e recusam tratamentos.Muitos(as) deles(delas) acabam caindo nas drogas ou no alcoolismo.E todos os casos deste tipo são, sem exceção, de pessoas neurotípicas.
As amizades feitas em círculos sociais muito largos e extensos são na sua maioria superficiais e falsos, com uma incidência muito grande de traições, especialmente de confiança.
Mas, se forem analisar melhor, na verdade existem muitos tipos de sociabilidade diferentes, e que não podem ser atribuídos a “graus” de sociabilidade, inclusive porque senão acaba se fazendo algo pernicioso: um “ranking” de sociabilidade, em que se valoriza mais os mais sociáveis e menos os menos sociáveis, e isto é altamente equivocado. O valor das pessoas como pessoas humanas não está em sua sociabilidade ou isolamento, mas sim na retidão de seu caráter,na sua honra, na sua dignidade, na sua honestidade,em suas vitórias e superações,na sua sensibilidade.Se tudo isto se externa ao reconhecimento social por suas atitudes, o isolamento em si ,ou a falta de sociabilidade,não desabona em nada a pessoa,se ela tiver caráter,for digna, honesta ,honrada e tiver superado os obstáculos da vida.Só lhe agrega valor , e é uma característica típica dela, que pode desviar do padrão comum sim, mas, e daí?Não é obrigatório todas as pessoas serem pré-fabricadas, padronizadas, iguaiszinhas umas às outras!
Então, quais os outros tipos de sociabilidade?
Um que está aumentando muito de popularidade é a chamada Sociabilidade Virtual. Sim, Sim, a maioria das pessoas torcem o nariz para ela, tendem a desvalorizá-la, dizendo coisas tipo “não é a verdadeira sociabilidade”, “não tem valor como sociabilidade porque não tem contato físico,olho a olho” e outros argumentos irracionais,sem sequer parar para analisar este tipo de sociabilidade a sério e a fundo.
A Sociabilidade Virtual é aquela em que as pessoas interagem com muitas outras em redes sociais, fóruns especializados, comunidades e grupos virtuais, e/ou formam redes em programas de mensagens instantâneas, como, por exemplo, o MSN, na Internet.
A forma mais primária de relacionamento interpessoal, na verdade o âmago de qualquer tipo de sociabilidade, é a fala. A troca de ideias, opiniões, os debates e discussões,as trocas de depoimentos, a conversa informal,as piadas e brincadeiras, as trocas de mensagens de todas as naturezas entre si.Isto costuma gerar muitas vezes, graus de identificação e de laços de afetividade que vão de simples conhecidos a namorados.
Isto existe em qualquer tipo de sociabilidade e está mais presente do que nunca na Sociabilidade Virtual, posto que seja sua essência por natureza.
A falta de toque físico ou de “olho no olho” não impede a criação de sentimentos mútuos, laços afetivos ou trocas de estados emocionais.
Então ela preenche todos os requisitos para ser uma forma de Sociabilidade válida e saudável.
Não é possível mais querer taxar este tipo de sociabilidade de doente, ou atribuí-la a doenças mentais, síndromes, nem é passível de patologizá-la pelos terapeutas, por que ela leva comumentemente às pessoas a buscar um contato ao vivo entre elas depois e muitas vezes a pessoa acaba conhecendo em pessoa seus amigos virtuais com o tempo, seja alguns deles ou a maioria deles, e isto acaba ocorrendo com o tempo, uns num ritmo mais lento, outros, mais rápido como consequência natural.
Aspergers mais e mais tem sido muito bem sucedido na Sociabilidade Virtual, e mesmo que não tenham muitos amigos ao vivo, não podem ser taxados de isolados.
A tendência inexorável para o futuro, seja para aspies ou neurotípicos, é a Sociabilidade Virtual dominar a sociedade e passar a se tornar o novo padrão de sociabilidade dominante, e isto está ocorrendo de forma arrasadora, na velocidade de uma Astronave Enterprise. Não há como Pará-la,ou bloqueá-la e daqui à menos de uma década, a nível mundial,ela será o padrão absoluto, não tenho dúvidas.Não se conseguirá mais ser fisicamente sociável se não for virtualmente sociável primeiro.
Mas mesmo dentro da chamada sociabilidade física, existem outros tipos de sociabilidade:
Por exemplo, existem aqueles que têm muitos amigos, especialmente de trabalho, mas pouco os vê, quase não os visita e eles pouco o visitam, mas que estão em contatos esporádicos seja ao vivo, ao telefone, ou virtualmente na internet. Como, por exemplo, cientistas, que trocam informações e experiências com outros do outro lado do país, em outros países, ou do outro lado do mundo, e vão se encontrar para um chá ,cerveja ou cafezinho e um pouco de conversa depois daquele simpósio ou congresso em que participaram.É a Sociabilidade Pontual.
Ainda outro tipo é a Sociabilidade Familiar:
São aquelas pessoas que, em muitos casos (mas não todos), preferem restringir, por conta própria, seu círculo social à sua família, ou quando muito, aos parentes um pouco mais distantes. Tem como amigos primos(as),tios(tias),avôs(avós),além de pais e filhos e irmãos,com que convivem com mais familiaridade, segurança e com quem ficam mais à vontade, sentindo-se inseguros de incluir mais alguém que não seja o(a) namorado(a),noivo(a),ou marido(esposa).E fica feliz assim, sem necessitar de mais ninguém.Muitas vezes não é nem o caso de se sentir inseguro em fazer novas amizades,é uma pura e simples falta de necessidade mesmo, porque já está tão feliz e satisfeito com este tipo de sociabilidade que não sente falta de fazer novas amizades com pessoas externas.E isto não é doença,não é síndrome, não é patológico, é algo agradável, que faz bem,traz felicidade e é da própria natureza da pessoa.Não há nada de errado nisto.É algo perfeitamente saudável!
Não se pode confundir uma falta de necessidade com falta de capacidade. Uma coisa nada tem a ver com a outra.
E esta falta de necessidade não é uma aberração psiquiátrica, porque o núcleo familiar já substituiu a roda de amigos como círculo social, porque neste caso, são os familiares a roda de amigos dele (a) e se querem saber, até mais saudável, por ter laços mais fortes e duradouros e menos suscetíveis a traições e decepções!
A família, afinal, é o núcleo principal da sociedade, a partir de onde ela se forma. Exigir que a pessoa rompa seu círculo para alargá-lo quando ela está feliz com o que tem é submetê-la a pressões, angústias e depressões tão injustas quanto desnecessária.
Mas em tempos modernos há um outro tipo de sociabilidade: a Sociabilidade de Interesse.
Esta é uma forma mais virtual do que ao vivo, mas geralmente inclui, mais cedo ou mais tarde, a amizade ao vivo.
São os contatos, especialmente de trabalho, profissionais, que a pessoa precisa fazer para serem bem sucedida na sua carreira profissional, pessoas-chave que são necessárias para dar aquele “empurrãozinho” na sua carreira, para fazer sucesso. Um escritor, por exemplo, pode fazer amizades tanto virtuais como ao vivo, ou ambas,com donos de editoras, profissionais da mídia, ilustradores,profissionais que trabalhem dentro de postos-chave dentro das editoras, distribuidores de livros, livreiros,donos de livrarias, executivos do ramo editorial e executivos de grandes empresas de outros ramos que podem patrociná-lo, ou ainda, com políticos influentes.
Estes contatos sociais podem vir a serem frequentes e com o tempo o relacionamento ultrapassar as fronteiras da amizade interessada e do aspecto profissional. São uma forma de sociabilidade importante para as carreiras e as vidas das pessoas, que podem levar inclusive à ascensão social tão desejadas por tantas famílias para seus filhos.Eu diria que, em se tratando de adolescentes, este tipo de sociabilidade é muito mais importante para o futuro dele do que a chamada sociabilidade tradicional de barzinhos e danceterias, que afinal, quase sempre levam a final profissional nenhum.
E recomendo enfaticamente aos pais de adolescentes aspergers que incentivem muito mais seus filhos a este tipo de sociabilidade, a de Interesse, do que a tradicional, e neste caso, a Sociabilidade Virtual é importantíssima, pois hoje em dia os contatos profissionais e comerciais estão muito mais acessíveis virtualmente do que ao vivo.
Enfim, temos as pessoas que preferem se isolar completamente, ou ainda viver em casais isolados. Esta tendência ser da natureza da pessoa nem sempre é patológica, fruto de alguma desordem ou distúrbio mental ,nem um déficit de desenvolvimento social.Acredito que só possa ser diagnosticada desta maneira, se a pessoa sofrer angústias e depressões graves que afetem seu trabalho, sua ocupação, sua vida, sem ser por pressões externas, mas por algum problema psicológico interno sério.
Já as pessoas que se isolam por que querem e são felizes assim devem ser deixadas em paz e não rotuladas, diagnosticadas, presas a tratamentos contra a vontade ou por pressão, e não se deve entupi-las de remédios tampouco. A opção delas deve ser respeitada.O isolamento em si só é uma patologia quando traz sofrimento para a pessoa em si,indiferentemente de pressões externas de outras pessoas.E isolamento, vejam bem, NÃOÉ sinônimo de infelicidade.Existem sim pessoas perfeitamente saudáveis psicologicamente que são perfeitamente felizes isoladas.Tentar forçar uma sociabilidade nelas que vai contra a natureza delas pode até causar tragédias, como o caso, por exemplo, das meninas-lobo da Índia, no final do século XIX.Elas foram abandonadas pelos pais e foram criadas por lobos.Um grupo de pesquisadores ocidentais, inconformados ,resolveu adotá-las e tentar readaptá-las ao mundo humano e as tornar sociáveis com as pessoas.
Estas meninas até então se comportavam genuinamente como lobas e eram perfeitamente felizes do jeito que viviam, entre os lobos.
Após sua adoção e retirada da selva, elas passaram por tratamentos psiquiátricos e uma reeducação.
Não apenas os cientistas fracassaram em reeducá-las e tratá-las, como as meninas adquiriram graves problemas psiquiátricos que não tinham antes, sérios traumas, violentas angústias e depressões, e acabaram, as duas, morrendo infelizes pouco tempo depois, ainda crianças. Se estas meninas tivessem sido deixadas em paz e continuassem na selva seriam felizes pelo resto de suas vidas e teriam vivido bem mais!
Isto mostra bem, apesar de ser um caso extremo e muito raro, a inaceitável intolerância da ciência e da sociedade como um todo, para não dizer preconceito e bitolação, para com o isolamento social de qualquer natureza, seja por opção ou não, e ela está aí até hoje, e precisa ser combatida. É preciso entender de uma vez que a insociabilidade por opção consciente,em muitos casos é algo saudável e natural,e perfeitamente aceitável.
Apenas para concluir então, digo que também é possível uma pessoa ter vários tipos de sociabilidade diferentes ao mesmo tempo, e nenhuma delas ser a clássica, ou mesmo a clássica ser uma delas, seja a pessoa asperger/autista ou não.
É preciso enfatizar a necessidade de tolerância, compreensão e aceitação da Ciência e da Sociedade aos demais tipos de sociabilidade que não a clássica, e aos pais de aspergers/autistas, que antes de exigirem de seus filhos, ou sonharem para eles com, a sociabilidade clássica, pensem bem qual, ou quais os tipos de sociabilidade de seus filhos e quais estes pais acreditam se encaixar melhor na natureza de seus filhos e serem as melhores para o futuro de seus filhos. E a melhor delas, nem sempre é a clássica.

Um comentário:

  1. concordo plenamente,pois nem sempre o senso comum de socialização entende o verdadeiro significado de uma interação saudável.

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